Introdução
O primeiro banco de dados que conheci não tinha chave primária, JOIN, trigger ou constraint.
Era um arquivo texto. Um flat file.
Com separadores. Com quebras de linha. Com lógica feita no braço.
E sabe o que é mais curioso? Funcionava. Funcionava porque nós entendíamos o que estávamos gravando.
Texto é onde tudo começou
Antes do Paradox, do SQL Server, ou dos NoSQLs modernos... o texto era o banco.
.txt
com pipe (|
) como separador.dat
com campos de tamanho fixo.csv
antes mesmo do Excel popularizá-lo
Tudo resolvido com ReadLn
, WriteLn
, Pos
, Copy
, Split
— e uma boa dose de engenhosidade.
Não havia schema, mas havia lógica
Você precisava:
- Entender os dados
- Saber onde cada campo começava e terminava
- Controlar a estrutura mentalmente
Era rudimentar? Sim. Mas era transparente. Você via os dados. Não precisava de ferramenta para abrir, nem de decoder — era texto puro.
Texto ainda é a salvação
Hoje falamos de banco em memória, banco orientado a grafos, sharding, Redis, estruturas complexas...
Mas quando tudo quebra, quando nada sobe, quando o banco não responde...
Um dump em texto ainda salva.
Porque texto sobrevive ao tempo, aos sistemas, às versões. Texto é interoperável. Texto é portátil. Texto é legível. Texto é humano.
E às vezes... o texto ainda vence na performance
Nos anos 2000, disponibilizei em um site no Japão uma base completa de endereços do país — em flat file.
A busca era feita em Perl, linha a linha, direto no arquivo. Sem banco, sem SQL, sem índice.
E o resultado?
Extremamente rápido.
Naquela época, sem SSD, sem cache sofisticado e com hospedagens modestas, o texto ainda entregava desempenho real.
O segredo? Nenhum. Apenas:
- Arquivo bem estruturado
- Leitura sequencial eficiente
- Ausência de camadas desnecessárias
Isso não é nostalgia. É engenharia feita com consciência.
O texto evoluiu, mas nunca nos deixou
Hoje, usamos JSON
, YAML
, CSV
, XML
, TXT
— com nomes mais elegantes, mais delimitadores, mais padrões...
Mas no fundo, continuamos gravando texto.
O JSON é o novo flat file — só que com aspas e chaves.
O YAML é o primo tipado do .INI.
O CSV, bem... esse nunca foi embora.
E o TXT? Continua segurando logs, backups, dumps e até instruções críticas.
A verdade é: o mundo moderno ainda depende do texto para sobreviver.
Configurações em texto: o .INI e a beleza funcional
Enquanto JSONs são exportados, YAMLs exigem indentadores e XMLs exigem fôlego...
...o .ini
continua sendo um dos formatos mais belos e funcionais que a computação já viu.
[Servidor]
Host=127.0.0.1
Porta=5432
[Seguranca]
ModoDebug=false
TentativasMax=5
Sem aspas. Sem colchetes duplicados. Sem tag de fechamento. Legível, editável e direto.
Você é lindo, meu.ini
.
Porque enquanto o mundo tenta parecer mais inteligente do que é,
você só resolve o problema.
Conclusão: o texto não é um plano B. É o plano base.
Em meio a banco distribuído, sharding, microserviços, mensageria, filas...
Se você ainda enxerga um .log
, um .csv
, um .ini
, um .json
, você está vendo o texto tentando salvar a ordem.
Texto é a origem.
Texto é o meio.
Texto ainda é — e sempre foi — a salvação.